Editorial – Resgate de material histórico e a necessidade de Timóteo se reconectar com suas vocações

Jornais impressos são verdadeiros documentos que relatam parte importante da história. Alguns jornais do Alfa foram recuperados antes da demolição completa
Acervo histórico do Uirapuru, festival de repercussão nacional que acontecia em Timóteo, quase se perde com demolição do Alfa
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Editorial – Resgate de material histórico e a necessidade de Timóteo se reconectar com suas vocações

O editor promove reflexão sobre a importância de o município valorizar sua história, ter claro sua identidade e a necessidade de reconexão com suas vocações, e cita exemplos nesse sentido. Na foto acima, alguns dos nomes que brilharam no Festival Uirapuru que aconteceu em Timóteo

O editor promove reflexão sobre a importância de o município valorizar sua história, ter claro sua identidade e a necessidade de reconexão com suas vocações, e cita exemplos nesse sentido. Na foto acima, alguns dos nomes que brilharam no Festival Uirapuru que aconteceu em Timóteo

 Márcio de Paula – 

O resgate de parte do acervo cultural que compreende vídeos, fotos, jornais, quadros e troféus do antigo Clube Alfa, realizado pelo editor da Revista Caminhos Gerais, Mario Carvalho, e por esse editor do Jornal O Informante, Márcio de Paula, promove uma série de reflexões.

A ação foi possível graças à sensibilidade de um dos novos proprietários, Jomar Souza Andrade, ao perceber que em meio à demolição poderia ter objetos importantes, e ele estava certo. Porém essa sensibilidade faltou à última direção do Alfa que poderia ter doado o acervo. Por pouco, tudo não virou entulho. Além de importantes registros esportivos, ali estava parte da história do Uirapuru, um festival de música com reconhecimento nacional.

Artistas como Morais Moreira, Luiz Caldas, Jair Rodrigues, Zé Ramalho, Luiz Gonzaga, Belchior, Paulinho Pedra Azul, Zé Geraldo, Almir Sater entre outros abrilhantaram os palcos do Festival, que foi apresentado na maioria das vezes por Elke Maravilha, mas também contou com a atriz Patrícia Pillar e o falecido ator global Lauro Corona e o mestre Grande Otelo.

O Festival que aconteceu em Timóteo em meados das décadas de 80 e 90 era tão significativo, que Almir Sater o escolheu para lançar nacionalmente seu novo disco na época. Mas a relevância do Uirapuru foi além de projetar Timóteo para o Brasil e gerar renda para o município. Tinha função quase que pedagógica na formação cultural das novas gerações.

O Uirapuru Mirim, como destacou o músico Edmilson Neves, que se apresentou pela primeira vez no festival em 1983 com apenas 12 anos foi determinante para identificar o que ele queria ser quando adulto. Tanto para crianças que subiram ao palco, como para aquelas que apenas acompanhavam os pais, a presença em um festival dessa envergadura ou qualquer outro grande evento cultural, desperta o interesse pela música e arte em geral. E dentro dessa premissa é importante ressaltar que arte transforma vidas.

Rubim do Bandolim que aos 16 anos se apresentou no palco principal do Uirapuru, depois se tornou uma referência nacional do bandolim, integrando posteriormente o grupo Flor de Abacate, um dos maiores de Choro do Brasil. Mas antes tocava nas escolas de samba nos carnavais de Timóteo, outro importante instrumento na formação musical e cultural da cidade, que também acabou.

Ao analisar os antigos jornais impressos do Alfa é possível identificar algumas vocações do município, entre eles, eventos culturais que ajudam na formação de novos artistas e agregam valor e bagagem cultural à população. Outra característica são eventos com participação de toda família e quase nenhum transtorno quando o assunto é segurança.

É difícil um município criar uma identidade cultural, e não por acaso, era em Timóteo que acontecia um dos melhores carnavais e festivais do estado. Reconhecer sua identidade é fundamental para fomentar sua economia e atrair investimentos. Essa é a fórmula de sucesso de muitas cidades mineiras.

Tiradentes, por exemplo, tem identidade gastronômica, lá acontece um dos maiores festivais de gastronomia do país. O Chefe de Cozinha Guidine, que mora em Cel. Fabriciano e trabalha em Ipatinga, escolheu essa cidade para abrir seu restaurante, em função de Tiradentes se identificar com seu propósito. O local já foi definido e o terreno comprado.

Outro exemplo é Diamantina, a cidade tem vocação de bandas e lá acontece a Vesperata, um grande show em que bandas tocam nas sacadas dos casarões históricos. O evento atrai turistas de todo Brasil e acontece, no mínimo, nove vezes ao ano, movimentando a economia da cidade. Já Ipoema, distrito de Itabira, era parada dos tropeiros que percorriam na época a estrada real. Lá foi criado o Museu do Tropeiro e o turismo é a principal fonte de renda do distrito. Ouro Preto é outro bom exemplo de respeito à sua identidade e história, e também tem no turismo uma das forças motrizes que movimenta a economia.

O Uirapuru foi representativo para Edmilson Neves e o amor pela música e pelos palcos ultrapassou gerações. Sua filha Bianca é vocalista da Banda Emma, banda de baile criada pela empresa Emalto, que, aliás, investe na formação de músicos através de sua Fundação.

Ainda há Blocos em Timóteo que desfilaram nos carnavais que tentam resistir, como o grupo afro Afoxé e o Império da Sede, mas enfrentam dificuldades pela falta de apoio. Contudo, através de muita resiliência e criatividade tentam sobreviver. O texto não propõe a volta do Uirapuru por exemplo, mas o reconhecimento da vocação cultural do município a partir do estudo de sua história, além de políticas públicas de fomento a novos eventos culturais, ou até antigos em novos formatos, em função do atual modelo de sociedade.

Um bom exemplo de respeito a vocação e tradição em Timóteo vem da inciativa privada através Fundação Aperam Acesita, que realiza todos os anos a Cantata de Natal, com participação de coral adulto e infantil. Um evento musical considerado um dos mais belos de Minas Gerais quando o tema é Natal.

Timóteo necessita criar um Museu para população se reconectar com suas vocações. Um local onde sua história seja exposta e projetada. A Casa de Memória da Câmara Municipal está abandonada há muito tempo, e mesmo que volte  a funcionar, precisa ser repensada do ponto de vista conceitual.  O Forno Hoffman sempre é tema de discussão política, mas há décadas passa por processo de deterioração, servindo apenas de reduto para morcegos que incomodam a vizinhança. Qualquer ação no Hoffman, se acontecer, vai demandar muito tempo, no entanto, sua revitalização ainda é muito importante, mesmo já tendo caído boa parte de sua estrutura.

A sugestão é criar um Museu. E para reduzir custos, pode ser em algum equipamento da prefeitura municipal, como por exemplo, o mercado municipal, rodoviária ou parte da atual sede da subsecretaria de cultura, ambas no centro da cidade. Um ambiente dinâmico com instalações, projeções e interação dos visitantes, onde ele possa, por exemplo, tocar algum instrumento enquanto acompanha as projeções de carnaval ou soltar a voz com as antigas letras premiadas no Festival Uirapuru. Que o visitante possa além de apreciar também participar, como acontece em alguns museus e instalações contemporâneas.

Os recursos podem ser obtidos junto ao BMG, BDMG, Ministério do Turismo ou verbas parlamentares. O momento é propício pela proximidade das eleições de 2022 e pela existência de uma CPI que sempre resulta na liberação de muitas verbas parlamentar. Outra possibilidade são Parcerias Público Privadas (PPP). Dentro da prefeitura há engenheiros e arquitetos que podem desenvolver os projetos,  sem ser preciso investimento a mais por isso. Um Museu desse porte trará retorno cultural e financeiro ao município.

Esse resgate antes da demolição do Clube Alfa joga luz à necessidade de Timóteo se reconectar com sua história cultural, lembrar de onde veio, como chegou até aqui e projetar o futuro com ações que comece no presente, mas sem perder de vista suas vocações, além da possibilidade de aproveitar o boom tecnológico. É preciso criar estratégias para voltar a gerar receita e entretenimento através da cultura. As sugestões estão postas, mas há uma série de possibilidades além das sugeridas, contudo, fazer acontecer passa pelo poder público.

 

 

Segue link da matéria do jornal O Informante sobre a recuperação de parte do acervo histórico do Uirapuru e entrevistas com personagens importantes da história do Festival.

Acervo histórico do Uirapuru, festival de repercussão nacional que acontecia em Timóteo, quase se perde com demolição do Alfa